Electrónica pela electrónica, ritmo pelo ritmo, jogo pelo jogo, numa produção surpreendente dos portugueses Niagara. Ou seja, António, Alberto e Sara, um trio de Lisboa que propõe seis temas de esqueleto sonoro simples e minimalista, mas que acredita em pequenos reajustamentos, desvios do caminho principal, acidentes não previstos.
Não é propriamente música para dançar apesar de se poder dançar, desde que exista algum sentido de equilíbrio. Em Portugal não existem propriamente pontos de contacto que os ajudem a enquadrar, embora na atitude livre com que encaram a matéria sonora se possam encontrar analogias com algumas aventuras recentes da música de características electrónicas feita em Portugal, como os Gala Drop, Tiago, Slight Delay ou Photonz.
Mesmo quando o olhar se amplia para o mundo não é fácil posicioná-los. Pode pensar-se nos desvios mais exploratórios de Akufen, Herbert, Matmos ou Jan Jelinek, mas mesmo assim escapa qualquer coisa. São tão marcados pela música house dos primórdios, como pelo rock alemão nada convencional dos anos 70, simbolizado pelos Can ou Neu!.
Há profundidade de campo, um balanço insinuante que não se deixa adormecer na mesma estrada, como se o condutor andasse em sentido contrário, apesar de se sentir um discreto calor emocional.
São temas instrumentais, com alguns apontamentos vocais, de superfícies sonoras abstractas, mais preocupados em sugerir do que impor seja o que for, feitos de impressões digitais e aragens aveludadas. Como se não bastasse a música, realce também para a capa (da autoria da artista plástica americana Natalie Westbrook), num todo que denota um cuidado estético tão surpreendente quanto excelente.
Manuel Vicente in Fact Mag Pt
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