segunda-feira, 4 de abril de 2011

Thollem & John, Wasteland Jazz Unit And Niagra At Bodyspace

Thollem / Dieterich
All For Now
Dromos Records
2011

Nascido da empatia criada entre o pianista Thollem Mcdonas e o guitarrista John Dieterich (dos Deerhoof), All For Now é a gravação desse primeiro encontro no Moma de São Francisco. Tendo em conta a disparidade aparente entre os dois músicos, All For Now é um documento impressionante no modo como duas linguagens distintas se enredaram tão naturalmente no processo. Disco criado da cumplicidade entre os dois músicos, tem a seu favor o facto de conseguir com notória despretensão erigir momentos de comunicação sem desprimorar todo o apuro formal patente nos seus currículos. Com esse carácter espelhado em nomes como “For Preservationists to Get Off on Later...Posthumously” ou “Drum Set. Or... ...Because...The Museum Will Act Like...Huh?” apresenta 16 malhas relativamente curtas de improvisação lírica. O piano de Thollem em tangentes devedoras do free jazz a alguma música contemporânea vai encontrado as linhas de guitarra oblíquas de Dieterich em construções sóbrias de um rigor melódico intrigante. Sem forçar tácticas desconstrutivistas, confere igual protagonimo as ambas as partes, num todo de elegante coerência que peca apenas por algumas miniaturas algo inconsequentes na sua irresolução. Reflexo de um savor faire em desafio, com momentos particularmente felizes na tensão de “I'll Keep Thinkin...And Watchin...For Ideas...By Myself`s” ou no mantra soturno (com o fantasma de Glenn Gould a pairar) de “Some Dancing People...This Labor Day”.



Wasteland Jazz Unit
Caustic Gate
Dromos Records
2011

Duo de Cincinati constituido por Jon Lorenz (saxofone) e John Rich (clarinete), que desde 2007 tem vindo a construir um corpo de obra imenso em editoras como a American Tapes ou a Excite Bike e chega à Dromos com Caustic Gate envolto em mantas de distorção. Com um sucinto nome a sugestionar de forma assertiva aquilo que têm vindo a fazer, Caustic Gate é uma terra de ninguém que escapa ao free jazz com recurso a uma manipulação extremada das potencialidades dos dois instrumentos ao ponto do não reconhecimento. Sem forçar comparações inusitadas, poder-se-á encontrar um presciente ideológico na totalidade dos Borbetomagus filtrada pelas tácticas noise características de alguém como o John Wiese ou Aaron Dilloway. “Collision Cleansed” descreve arcos de distorção feérica assentes no duelo possível entre os dois músicos que nunca cede ao militantismo de chamada-resposta. Antes na subjugação do som ao seu limite visceral até um final sem vencedores. Adaptando uma narrativa, pode-se pensar numa guerra que descamba no ambiente desolador de “Current Residue”. Com os sopros a assumirem a criação de um drone povoado por war cries sibilinos que nunca sucumbe na sua maior rarefacção. Nem à contemplação letárgica. Antes na perpetuação durante 15 minutos de uma mesma terra de ninguém por uma via eminentemente mais plácida. “Erosive States” condensa em cerca de quatro minutos todos os elementos mais ruidosos do duo até ao ponto de ruptura do feedback. Fechando o portão de um disco cáustico que evita com sapiência a barulheira brute force para se assumir como um objecto de considerável impacto anímico.



Niagara
Niagara EP
Dromos Records
2011

Trio de Lisboa que tem vindo ao lado de nomes como Photonz ou Tiago a reinventar o panorama das electrónicas dançáveis nascidas no burgo, e que consegue nesta sua estreia um equilíbrio fascinante em torno de diversas linguagens. Partindo das premissas base da House de Chicago como profetizada por Phuture, para recolher os destroços mais lúdicos de algum Krautrock, do som de Colónia (e relembrar como os Mouse On Mars são incríveis) ou de alguma Micro-House na linha de Farben, para chegar àquele ponto de mutação fractal que tem nos Black Dice pós-Creature Comfort ou nos Excepter circa Self Destruction referências subliminares. Disco com vista panorâmica sobre a boa onda total, assenta numa metodologia insinuante que adapta todas essas linguagens sem as impor descaradamente. Numa lógica interna que dispõe nuances melódicas e rítmicas evitando uma organização mais estrita para assumir essa instabilidade de processos como um fim em si mesmo. Que tanto pode passar pelo escapismo mental como pela dança possível. Há toda uma noção de risco ao longo destas seis malhas, brilhantemente conduzido pelas mãos de António, Alberto e Sara, num plano continuamente intrigante que nunca resvala para o experimentalismo inócuo. Paira sobre tudo isto uma vibração bem tropical de dimensão psicadélica que um nome como “Travesti + Palmeiras AV” vem sugestionar, com os rasgos de voz iluminados pelo delay a darem razão ao pressuposto. “E-Muzik” tanto poderia ser o nome de uma música dos Harmonia como reaproveita as lições deixadas por “Watussi” para bom efeito. “Balão” fecha o disco sob uma manta de teclados líquidos que faz da praia um estado mental, numa estreia notável de um dos nomes mais singulares do agora. Seja aqui ou em qualquer lado.


Bruno Silva at Bodyspace

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